Dentro de mim existe um lugar onde vivo inteiramente só
e é lá que se renovam as nascentes que nunca secam.
P.Buch

29 de maio de 2011

Ser ou não Ser

Lembro-me de Cora Coralina quando vejo o que está acontecendo em Campinas em relação à Prefeitura. É que Cora Coralina dizia que a gente deve, quando sair de algum lugar, deixá-lo melhor de que quando entrou. Tão sábia, a linda Cora Carolina que aprendeu tudo fazendo as coisas do dia a dia e tirando daí as metáforas que encantaram sua vida.

No Yoga, que surgiu na Índia há milênios, aprendemos que existem algumas regras em textos sagrados que nos ensinam como devermos orientar as nossas relações com o mundo externo para vivermos um estado de consciência virtuoso. Algumas dessa regras são parecidas com os 10 mandamentos que aprendemos no cristianismo. Essas regras de conduta são verdadeiras em qualquer lugar do mundo, em qualquer tempo. Por exemplo: não roubar. Não roubar, é igual aqui no Brasil, no Japão ou na Finlândia; hoje, ontem ou na eternidade.

Ficamos indignados quando vemos a conduta das pessoas que estão no poder político e, sim, temos que nos indignar mesmo porque a sociedade não é suprida em suas necessidades básicas por conta desses desvios de caráter.

Mas acho que isso pode servir como uma inspiração para que nos observemos no dia a dia. Para saber quanto do “não roubar” eu ainda tenho de trabalhar dentro de mim. Por exemplo, quando escrevemos algo e não colocamos o autor daquela frase, ou daquele comentário deixando todos pensarem que é de nossa autoria. Isso é um roubo. Quando numa conversa não damos tempo do outro falar, estamos roubando o seu tempo. Quando nos apropriamos de ideias dos amigos de trabalho, quando fazemos ligações clandestinas (o chamado “gato”) de eletricidade ou de TV a cabo; quando eu furo a fila ou quando paro no lugar dos deficientes ou dos velhinhos. Roubamos também a paciência do outro. Não é o valor que se rouba, mas a atitude que fere nossa consciência. A lista é grande e o ideal é extirpar essas atitudes de dentro de nós.

O “roubar” está ligado ao fato de querermos ter algo que nos faz felizes, esquecendo que fazemos parte de um todo e que não somos separados de nada. Esquecemos que aquilo que faço é lançado no universo e, já que faço parte do universo, sou invadido por isso. Então a atitude de roubar faz com que eu esteja sempre sendo invadido pela falta.

“Não roubar” é não roubar nada, nem uma agulha sequer. Não é o caso de olhar só para o vizinho, nós temos que ser disciplinados quanto a isso. Temos que praticar ativamente, invertendo nossa tendência, removendo de dentro de nós essa conduta. Roubar um milhão de reais é a mesma coisa que roubar um real. A atitude é a mesma.

Se a gente vai se reestruturando quanto a isso, vamos permitindo uma transformação de nossos pensamentos, emoções. Não podemos permitir que nossa mente se disperse e esqueça o que estamos fazendo aqui.

"Para que uma árvore dê os seus frutos não basta plantar a semente, há que primeiro tratar do solo onde se vai semear." Swami Niranjanananda Saraswati

Não estamos aqui neste corpo físico só para TER coisas, estamos aqui para SER. Recebemos esse corpo físico, todo capacitado para pensar, sentir e fazer com a finalidade de podermos ter experiências nesse momento único da eternidade, para lembrarmos o que estamos fazendo aqui, para lembrarmos quem somos. Se eu não sei quem sou, se não sei o que estou fazendo aqui, então roubar significa muito pouco. Mas se sei quem sou e se sei que faço parte do universo, eu não preciso roubar nada, porque tudo que preciso está aqui, no universo, no meu ser.

Comecei esse post querendo falar de Cora Coralina que me inspira tanto e de repente as palavras foram para outro caminho. Agora, fico pensando em como amarrar a primeira frase com a última. Do meu quarto olho pela janela e vejo o céu avermelhado, lindo. Fico ali um pouco agradecendo essa imagem e penso em Cora Carolina e penso que também quero sair desse mundo e deixá-lo melhor do que quando eu cheguei.

"Não sei se a vida é curta ou longa para nós, mas sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser: colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita, alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que acaricia, desejo que sacia, amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira, pura enquanto durar. Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina."  Cora Coralina

25 de maio de 2011

Por todas as nossas relações

Entrevista com Kaká Werá
"Quanto mais o indivíduo tem consciência de si, mais ele se percebe como um grupo."
"A consciência é ampliada quando conseguimos entrar no espaço vazio dentro de nós"

18 de maio de 2011

PROFESSOR HERMÓGENES


Namaste!
No último final de semana tive o prazer de conhecer de pertinho o Professor Hermógenes lá na casa Siloé, onde o Instituto de Yogaterapia fez um evento em sua homenagem. Com 90 anos, o Professor conserva uma alegria genuína que contagia a todos. Através de sua coerência e sabedoria diante das questões da vida, que muito me emocionaram, ele transmite a paz de viver uma vida simples, com profundidade, amor e leveza.
E diz: “Não deixe sua felicidade depender daquilo que não depende de você.Veja o Bem, ouça o Bem, fale o Bem e faça o Bem. E destacou que a sociedade ideal, onde seríamos felizes, é aquela onde cultivássemos a verdade, a justiça, a paz, a não violência e o amor.

Com bom humor ensinou: “Quando for dizer: eu sou (alguma coisa) capriche bem no final dessa frase. Não permita que pensamentos negativos invadam sua mente, tirando sua paz interna.

O Professor Hermógenes fala sempre que o ser humano está sofrendo de normose, a doença de ser normal, de fazer parte da norma. As pessoas querem se encaixar num padrão. Ter o mesmo carro, o mesmo perfume, o mesmo tipo de casa de lazer. A normose está doutrinando erradamente muitos homens e mulheres que poderiam, se quisessem, ser bem mais autênticos e felizes.

Repetiu várias vezes que para nossas preocupações sem soluções devemos ter em mente o seguinte mantra e vivenciá-lo:

Eu entrego
Eu confio
Eu aceito
Eu agradeço

O Professor é uma inspiração no tocante à retidão, à ética, à amorosidade, à disciplina e à coerência.

Foi um momento muito especial para mim e agradeço ao Márcio e à Rosângela que organizaram todo o evento com muito carinho para que nós ficássemos aconchegados e usufruíssemos de tanta beleza, delicadeza e quietude





 "Se te contentas com os frutos ainda verdes,
toma-os, leva-os, quantos quiseres.
Se o que desejas, no entanto, são os mais saborosos,
maduros, bonitos e suculentos,
deverás ter paciência.

Senta-te sem ansiedades.
Acalma-te, ama, perdoa, renuncia,
medita e guarda silêncio.
Aguarda.
Os frutos vão amadurecer."

Professor Hermógenes

10 de maio de 2011

Dona Irene


Irene fazendo broa
Dona Irene, 89 anos no dia 12 de maio, quinta-feira. Seu forte é a broa que ela faz para esperar os filhos, netos e bisnetos que vão tomar café da tarde com ela num sábado ou domingo. Ah, mas ela não faz só a broa não. Lava roupa, cozinha, vai ao supermercado andando devagarinho pelo bairro, encontra conhecidos e trocam meia dúzia de palavras, limpa toda casa e cuida de meu pai. Às vezes me pergunto como que ela ainda aguenta fazer tudo isso e ela me responde com simplicidade que pega a vassoura e ora: “Deus dai-me força para deixar essa casa limpa pro Senhor me visitar. É daí que tiro forças para fazer tudo o que faço”. Bom, nem preciso dizer que quando me bate uma pequena preguiça, lembro de minha mãe e a preguiça vai embora rapidinho.

Meu pai, admirado, me conta que ela faz ginástica na igreja do Parque Industrial duas vezes por semana, lugar onde umas 200 pessoas se encontram com o propósito de se movimentar. Quando o professor não vai ou está de férias ela faz os exercícios ali mesmo na sala da casa, num colchonete que ela mesma fez. Minha mãe é uma das mais velhas do grupo e se orgulha de dizer que consegue fazer quase todos os exercícios, inclusive alguns que suas colegas mais novas não conseguem. Ela não usa óculos, não precisa de um. Não toma remédio, tem suas próprias ervas que planta no fundo do quintal. Não consigo contar quantas pessoas ela, junto com meu pai, já ajudaram e, por isso, a casa deles sempre tem uma visita ou outra que nunca deixam de dar uma passadinha por lá para saber como estão dona Irene e seu João.

Dia 12 de maio ela faz 89 anos e o que ela mais quer é ver toda família lá, paparicando. E eu quero chegar nessa idade com a mesma vontade que ela tem de ajeitar o mundo para as pessoas, de ter essa fé que a mantém em pé e fazer o que tem que ser feito, de amar incondicionalmente a todos.
Parabéns dona Irene! Muitos anos de vida bem vivida.

Abaixo um poema do CD de Márcio Assunção "Mantras do Coração" inspirado numa oração da Atroposofia que me lembra minha mãe:

                Mãos
Mãos que abençoam e fazem o Bem
Mãos que trabalham e não se detem
Mãos que amorosa e a todos amparam
Mãos que rezam e sempre rezaram
Mãos que se elevam num gesto profundo
São dessas mãos que precisa o mundo
Mundo que faz a cura estar
nas mãos de quem sabe doar Amor
Amor.... Amor... Amor...

9 de maio de 2011

Habilidades

Descobrir nossas habilidades e colocá-las em práticas é um grande feito.
E realizar isso com otimismo e alegria faz com que novas oportunidades apareçam.
Não é o que você faz, mas como você faz é que te tira da "normose".

O video abaixo me inspira a ir um pouco mais além daquilo que já faço.

ou

6 de maio de 2011

Dia das Mães

Coincidências à parte, perto do dia das mães, e eu acabo de ler essa citação de um livro que estou estudando para fazer uma resenha para o meu curso. O autor conta uma experiência de relaxamento e diz:

“...Essas preliminares têm como objetivo acalmar a mente, e logo meus pensamentos turbilhonam menos. Sempre consciente da respiração que vai e que vem, eu me maravilho por estar vivo, aqui e agora, num corpo humano, corpo que é formidável simplesmente por estar vivo. Depois tomo consciência de que essa vida veio até mim através de minha mãe, que a recebeu da sua, depois de sua avó, e assim por diante. Tento achar a mais remota e feliz lembrança de minha mãe, e se há conflito – é mais freqüente do que se crê – passo a geração precedente. Tento também rever minha avó, se a conheci, para que tudo seja bem concreto. Depois, me conscientizo da linhagem ininterrupta e anônima das mães e, com amor, agradeço-lhes por terem assim transmitido a tocha da vida até mim. Não um agradecimento superficial, mas uma onda de amor. Inserido nesse passado sinto-me ligado a todo o passado da vida. Todas as experiências da vida estão contidas em meus genes, em minha vida. E que incrível soma de acasos foi necessária para que eu esteja aqui e agora.”

No Yoga há vários ásanas (posturas) onde abaixamos a cabeça simbolizando que eu reconheço a minha existência e a importância fundamental que minha mãe e meu pai têm nessa minha existência. Isso, temos que honrar! Honrar o que ficou atrás para eu poder seguir com a cabeça erguida e com humildade. Eu plantei o meu corpo. Meu corpo é perfeito e se torna mais perfeito ainda se eu honro o que fui. Só vou para frente quando honro o que vem antes de mim.

Assim, tocada com o que acabo de ler, deixo aqui minha profunda gratidão e reconhecimento a todas as mulheres (Irene, Silvana, Francisca, Roza...), mães de mães que me possibilitaram estar nessa experiência aqui e agora com toda a vida e experiências vividas por todas elas presentes em mim. Portanto somos todas ligadas como somos ligadas ao planeta, ao universo, ao mar, à floresta, à terra, ao fogo e ao ar. Tudo isso vive dentro de mim.

1 de maio de 2011

Yoga e Pão

Minha amiga Lilly em perfeita postura
Bom, eu não sou grande cozinheira, mas adoro cozinhar e curtir todo o ciclo do alimento. A terra acolhe a semente e dá os nutrientes, a chuva supre de água, o sol dá o calor necessário e tudo relaxa e descansa enquanto a semente desabrocha, cresce e se torna o que ela é em essência. O homem cuida da terra e, através do conhecimento milenar, sabe exatamente que deve colher no momento em que a vida está no ápice. Depois, há os caminhos percorridos até chegar na minha cozinha, onde escolho - e me encanto com - os formatos, as cores, as texturas e o cheiro. Aí misturo todos eles me lembrando das bruxas de tempos imemoriais, aquelas que eram sacerdotisas, curandeiras, professoras, poetizas e parteiras e que foram queimadas na Idade Média porque sua “ciência” fazia concorrência com a religião dominante. Na verdade, ser bruxa era reivindicar para a mulher o direito de ter poder e, para o homem, o de reconhecer a presença da divindade na feminilidade. Bom, voltando à cozinha, ao misturar os ingredientes, adoro ver a alquimia acontecendo, as cores se misturando, os sabores se complementando.

Esse sábado fui fazer o pão de aveia que aprendi com a Nani, uma cozinheira de mão-cheia que mora nas montanhas. Eu já tinha feito uma vez e ficou lindo.Desta vez, apesar de todo meu amor, de todo carinho... não deu certo. Como? Eu fiz tudo certinho. Não deu certo. Não cresceu. Não cozinhou por dentro...

Senti a maior frustração.Fiquei observando essa frustração e me lembrei que também tenho esse sentimento quando não consigo fazer perfeitamente algumas posições do Yoga. Por que não sai perfeito se me esforço, se pratico todos os dias e se faço com tanto amor? Então o sentimento é o mesmo.O Yoga diz que devemos observar nosso corpo e respeitá-lo. Não faremos nada que possa machucá-lo ou passar do seu limite hoje, e é através dele em harmonia com a mente que nos ligamos a estados expansivos de consciência. As posturas finais não devem ser o objetivo do praticante, mas sim a atenção no movimento, estar presente observando-se sem julgamento, para descobrir a inteligência, a consciência que está escondida no corpo. Mas meu ego ainda fica me dizendo para fazer as posturas iguais às do meu colega ao lado ou ainda iguais às da minha amiga e professora de Yoga, Lilly. Daí a frustração.

Por que juntei meu pão de aveia com a minha prática de Yoga? Bom, é que nos dois casos o sentimento de frustração apareceu. Nas práticas, cada dia acordo dizendo hoje é um novo dia e vou fazer cada movimento com toda a minha atenção como seu fosse o primeiro dia. Permito-me esse recomeçar e respeito todos os outros dias e as outras tentativas como fazendo parte de minha história corporal. Alguns dias consigo um pouco mais, outros um pouco menos, mas o estar presente, estar aberta para uma expansão é o que verdadeiramente me faz sentir com alegria que estou no caminho certo. Assim a frustração enfraquece e me sinto em harmonia, em paz.

Ah, sim, e o pão de aveia? Enfraqueci a frustração e, neste domingo de manhã, depois de minha prática e de dar duas voltas na Lagoa do Taquaral com o Ed, fui fazer um novo pão, com um novo sentimento, com concentração e presente no que estava fazendo. E esse deu certo.
Pão de Aveia
O pão se faz por sua bondade, com sua ajuda, com sua imaginação que flui através de você. Com a massa sob suas mãos, você a transforma em pão. Este é o motivo pelo qual, fazer pão é tão gratificante.

Tudo está conduzindo você, empurrando-o, instruindo-o, levando-o para o conhecimento supremo e perfeito. Isto quer dizer que não há enganos. Você pode fazê-lo de maneira diferente da próxima vez, mas isto é porque o faz assim desta vez. Perfeito, mesmo que diga: pus mais disto, pouco daquilo. É você, e, por favor, seja você mesmo. Ofereça-se. Cozinhar não está simplesmente na língua, no palato. Está no corpo inteiro, fluindo da virilha e do peito, pelos braços e pelas mãos.

Uma receita não pertence a ninguém. Dada a mim, eu a dou a você. Somente um guia, somente um esqueleto. Você deve cobri-lo de acordo com sua natureza e desejo. Sua vida, seu amor trarão estas palavras à plena criação. Isto não pode ser ensinado. Você já sabe. Por isso, cozinhe, ame, sinta, crie.

(The Tassajara Bread Book – Edward Espe Brawn)